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2. Autodesenvolvimento não é acumular títulos: é desapegar da versão anterior de você

E se crescer não fosse sobre acumular títulos, mas sobre ter coragem de deixar versões antigas de nós mesmos para trás? O verdadeiro autodesenvolvimento não está no próximo curso ou certificado, mas na disposição de desaprender, abrir mão de certezas e se permitir mudar de identidade. Como está sua prontidão para perder para, de fato, evoluir?

Você realmente quer crescer — ou só está tentando preencher um vazio com mais um certificado? Não é provocação vazia. É uma pergunta real. Quantas vezes a gente busca um curso novo não porque precisa daquele conhecimento, mas porque sente que falta alguma coisa? Uma ansiedade, um FOMO disfarçado de vontade de aprender, uma promoção que achamos que vai vir com mais uma conquista externa. E assim vamos empilhando certificados, formações, pós-graduações, achando que isso é sinônimo de evolução. Ou vamos também salvando conteúdos para "ver depois”, como falei no outro artigo desta edição (“Reaprendendo a aprender: como quebrar o ciclo de consumir sem transformar”). Mas e se o autodesenvolvimento não estiver em acumular, e sim em deixar algo para trás? Em desapegar da versão antiga de você que não cabe mais no agora?

A gente romantiza a ideia de aprender, mas se esquece de que ela vem com perdas. Aprender é mudar, é transformar. E toda transformação, antes de ser uma conquista, é um processo de morte. Exige abrir mão de uma parte de nós que já não serve mais - pode ser uma parte pequena e fácil de mudar ou grande, profunda e mais difícil. É abrir mão da versão que dava conta até aqui, mas que agora trava sua evolução. E não é fácil. Porque essa versão anterior já te trouxe reconhecimento, já te salvou de problemas, já te fez ser quem você é. Mas talvez também esteja te mantendo preso a um script um tanto ultrapassado ou apenas que não faz mais sentido.

Mas como bons humanos que somos, temos sentimentos, e sabemos que desapegar dói. Porque mudar não é só sobre o novo que você vai adquirir, é sobre o velho que você precisa deixar ir. E é aqui que a gente tropeça. Porque a ideia de perder uma identidade construída com esforço — o cargo, a área, o estilo de liderança, até a forma como nos comunicamos — assusta. A Harvard Business Review publicou um artigo que ilustra bem isso: “em contextos de mudança organizacional, as pessoas resistem não apenas por medo do desconhecido, mas porque sentem que precisam abrir mão de quem aprenderam a ser”. Isso não é resistência à mudança. É luto de identidade.

Segundo uma pesquisa da 24X7 Learning, sobre aprendizagem no local de trabalho, apenas 12% dos funcionários utilizam de fato o conhecimento adquirido em programas de treinamento em seu trabalho. Ou seja, embora consumam conteúdo, a maioria não transforma esse saber em ação concreta. A diferença entre consumir e se transformar mora nesse ponto cego: no quanto você está disposto a desaprender.

E o mercado também ainda premia mais o acúmulo do que a reinvenção. O LinkedIn está cheio de perfis com dezenas de cursos e certificações, mas na prática a gente ainda vê nas empresas pouca abertura para mostrar vulnerabilidades, mudanças de rota ou erros que geram verdadeiros aprendizados e evoluções. Falar que você concluiu uma pós soa mais seguro do que dizer “eu revi tudo que achava que sabia sobre liderança nos últimos meses” ou “eu mudei de opinião sobre como devo me relacionar com o time”. Mas é nessa revisão, nesse desapegar, que mora o desenvolvimento de verdade.

Crescimento exige coragem emocional, não só técnica

 

Falar de autodesenvolvimento é, antes de tudo, falar de coragem. Não a coragem de fazer uma apresentação em inglês ou liderar um time novo, mas a coragem de reconhecer que algo dentro de você não serve mais. Que sua forma de liderar, de comunicar, de decidir, de se ver… está pedindo atualização.

A Brené Brown fala sobre a vulnerabilidade como pré-requisito da coragem. E, no mundo do trabalho, isso significa expor incertezas, admitir limitações e pedir ajuda. Você está pronto para isso? Porque se não estiver, talvez nenhum novo curso te ajude. É preciso estar disposto a encarar as sombras que os certificados não mostram.

Desapegar da sua versão anterior é reconhecer que talvez aquele “jeito certo” que te trouxe até aqui não te leva mais adiante. É olhar para as crenças que guiaram sua trajetória e se perguntar: ainda fazem sentido? É ter coragem de dar espaço para o novo, mesmo que o novo venha primeiro como dúvida. É bancar uma nova postura mesmo antes de sentir domínio sobre ela. E isso é muito mais desafiador do que só fazer mais um curso.

Tem uma frase da autora Herminia Ibarra que gosto muito: “We learn who we are in practice, not in theory.” É isso. Não dá pra virar alguém novo só lendo ou ouvindo — é preciso se experimentar nessa nova versão. Tentar, ensaiar,  errar. Se ver num novo papel antes mesmo de se sentir pronto pra ele. Por isso, autodesenvolvimento real é menos sobre o acúmulo e mais sobre a disposição de se deixar mudar. O convite que faço aqui é para usarmos uma nova lente que não associa crescimento a ganho (de títulos ou certificações), mas a perder: status, certezas, rotinas e até relações que não fazem mais sentido. E como não aprendemos a perder, deixar ir, sei que tudo isso parece muito irreal, mas acredite: todo novo eu exige abrir mão de um eu antigo. E isso demanda elaboração.

Se autodesenvolvimento fosse só aprender coisas novas, seria fácil. Mas não é. 

A pergunta que fica, então, não é “o que mais você pode aprender?”, mas sim: “quem você está disposto a deixar de ser para evoluir?”

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